24 de nov. de 2010

João Candido - Manifesto da Revolta da Chibata


João Candido e um grupo de marinheiros revoltosos em 1910 promoveram a Revolta da Chibata contras os castigos corporais - chibatadas e palmatórias - do tempo da escravidão que a aristocrática Marinha insistia em manter tratando seus soldados como escravos.



Ilmo. Sr. Presidente da República


Cumpre-nos comunicar a Vossa Excelência como Chefe da Nação Brasileira:



Nós marinheiros, cidadãos brasileiros e republicanos

não podendo mais suportar a escravidão na Marinha Brasileira,

a falta de proteção que a pátria nos dá e até então não chegou,

rompemos o negro véu que nos cobria os olhos do patriótico e enganado povo.

Achando-se todos os navios em nosso poder, tendo ao seu bordo

prisioneiros todos os oficiais, os quais, tem sido os causadores da Marinha Brasileira não

ser grandiosa, porque durante vinte anos de República ainda

não foi bastante para tratarmos como cidadãos fardados em defesa da pátria.

Mandamos esta mensagem para Vossa Excelência faça aos Marinheiros Brasileiros

possuirmos os direitos sagrados que as leis da República nos facilita,

acabando com as desordens e nos dando gozos que venham

engrandecer a Marinha Brasileira, bem assim como, retirar os oficiais

incompetentes e indignos de servirem a Nação Brasileira;

reformar o Código imoral e vergonhoso que nos rege;

a fim de que desapareça a chibata, o bolo e outros castigos semelhantes;

aumentar o nosso soldo pelos últimos planos do Senador José Carlos de Carvalho;

educar os Marinheiros que não tem competência para vestirem a orgulhosa farda;

mandar por em vigor a tabela de serviço diário, que a acompanha.



Tem Vossa Excelência o prazo de 12 horas para mandar-nos a resposta satisfatória

sob pena de ver a pátria aniquilada.


Bordo do Encouraçado “ São Paulo” em 22 de novembro de 1910.


Marinheiros
*Manifesto dos marinheiros ao presidente da República/Arquivo da Marinha.

20 de mai. de 2010

Desconstruindo o racismo: Beleza Pura, uma música racista?


Beleza Pura
De: Caetano Veloso

Não me amarra dinheiro não/ Mas formosura/ Dinheiro não/ A pele escura / Dinheiro não / A carne dura / Dinheiro não / Moça preta do curuzu/ Beleza pura/ Boca do Rio/ Beleza pura/ Dinheiro não/
Quando essa preta começa/ a tratar do cabelo/ É de se olhar/Toda a trama da trança/ a transa do cabelo/ Conchas do mar/ Ela manda buscar pra botar/ no cabelo/ É de se olhar/ Toda a trama da trança/ a transa do cabelo/ Conchas do mar/ Ela manda buscar pra/ botar no cabelo/ Toda minúcia/ Toda delícia/ Não me amarra dinheiro não/ Mas elegância/
Não me amarra dinheiro não/ Mas a cultura/ Dinheiro não/ A pele escura/ Dinheiro não/ A carne dura/ Dinheiro não/
Moço lindo do Badauê/ Beleza pura/ Do Iê Aiyê/ Beleza pura/ Dinheiro yeah/ Beleza pura/ Dinheiro não/ Dentro daquele turbante/ do Filho de Ghandi/ É o que há/ Tudo é chique demais, tudo/ é muito elegante/ Manda botar/ Fina palha da costa e que tudo se trance/ Todos os búzios/ Todos os ócios/
Não me amarra dinheiro não,/ mas os mistérios

Beleza Pura música e letra de Caetano Veloso apesar de seu aparente e forte sentido de exaltação à beleza negra é carregada de imagens estereotipadas e preconceituosas.
Seria Caetano Veloso racista?
Acredito que não vá aí nenhuma má vontade minha com Caetano Veloso como não houve dele para com o autor de Feitiço da Vila quando ele fez uma releitura desconstrutiva da letra daquele samba revelando o preconceito racial contido naquelas imagens poéticas em torno de uma rixa entre Noel e Wilson Batista.
Beleza Pura procura fazer uma exaltação ao negro, à sua cultura e a sua sensualidade e assim parece passar uma idéia positiva na celebração da beleza negra.
Nos primeiros versos as rimas das palavras formosura/pele escura/carne dura/ beleza pura, sugerem uma imagem para a "moça preta do Curuzu" e o "moço lindo do Badauê" que se completa com as trançinhas enfeitadas com conchas do mar, o turbante chique e elegante dos Filhos de Gandhi e a participação nos blocos afro-carnavalescos formando uma plasticidade estereotipada do negro baiano. 
Mas a exaltação que se insinua à beleza negra tem contudo uma primeira condição: "quando essa preta começa a tratar do cabelo/é de se olhar":
O que isso sugere?
Que, ao contrário se a preta não trata do cabelo, ela não é visível, e quem seriam, onde estariam as pretas invisíveis, aquelas que não tratam do cabelo e que por isso não merecem ser olhadas?
Certamente, estariam fora dos blocos afro-carnavalescos e daqueles outros cenários que a letra da música identifica ou segere, são aquelas pretas que estariam numa condição miserável que as impediriam até de "tratarem" do cabelo da maneira mais singela que se pode permitir:
"Ela manda buscar pra botar/ no cabelo/ É de se olhar/ Toda a trama da trança/ a transa do cabelo/ Conchas do mar/ Ela manda buscar pra/ botar no cabelo"

Já, a segunda condição é repetida como um refrão e é ressaltada também para o reconhecimento e a visibilidade da beleza negra: a beleza é pura, o dinheiro, não, ele se opõe à beleza negra, ele a torna impura.
Não me amarra dinheiro não/ Mas a cultura/ Dinheiro não/ A pele escura/ Dinheiro não/ A carne dura/ Dinheiro não
A primeira vista é uma comparação positiva o dinheiro é sujo, a beleza negra é pura.
Mas vejamos, com este sentido, o dinheiro estaria sendo empregado como uma metáfora em oposição ao que a beleza negra representaria, a pureza.
Esta alegoria sugere que o dinheiro é um mal, é corruptor, impuro, excludente da beleza pura (negra ) que tem que estar oposta ao dinheiro para continuar pura.
Em sentido contrário, positivo, o dinheiro representa a liberdade, a visibilidade... e por que não, também, a beleza e a pureza?
Esta inversão de sentido do significado de dinheiro na letra da música Beleza Pura é para ressaltar o que pode ficar oculto numa imagem poética quando ela aparece associada aos múltiplos significados possíveis e mesmo opostos que a palavra dinheiro provoca: dependendo da maneira com que é empregada. Neste sentido, a letra da música Beleza Pura teria um significado ambíguo.
Seja sob o sentido negativo ou positivo do dinheiro pelo qual ele possa estar representado e relaciondo a uma idéia da beleza negra, aí se forma uma imagem que a condiciona a um modelo, a uma ordem, neste caso formada pelas crenças do artista e reveladas através de seu talento criador.
Como a realidade nem sempre é tão poética, ao contrário, o que podemos observar é que a imagem da beleza negra da forma como é exaltada na poesia é análoga a imagem do negro excluído socialmente.
E que também é a imagem que forma um quadro "feio" (oposto à beleza) da realidade e para amenizar a feiúra da realidade, porque não exaltar a beleza negra deixando a realidade mais bonita?(1)
O significado dessa exaltação à beleza negra idêntica a imagem do negro excluído é mais significativa quando colocada ao lado da crítica que Caetano Veloso faz às cotas raciais nas Universiddes Públicas e no emprego e que visam a redução das desigualdades econômicas e sociais entre negros e brancos.
Para Caetano junto aos "113 cidadãos anti-racistas..." que assinaram o manifesto anti-cotas raciais não deve existir uma beleza pura, o que eles defendem é uma "mestiçagem" que dilui não somente a identidade negra como o seu direito à reparação do que a cor da pele negra serviu para que lhe negassem: o direito à beleza e também o acesso ao dinheiro.
Esta interpretação de Beleza Pura na perspectiva desconstrutivista (2), assim como fez Caetano Veloso com Feitiço da Vila,  revelam "aquilo" que escapa nos discursos, nas sua "fissuras" dos sentidos: o que não conseguimos ocultar porque são nossas produções de desejos.
"Não me amarra dinheiro não,/ mas os mistérios"
Referências:
(1) Baumam, Z., O mal-estar da pós-modernidade, 1998, RJ, J. Zahar Ed.
Republicada em 20/05/2010
Primeira publicação em 23/08/2008

28 de abr. de 2010

O que é Racismo - Joel Rufino

Livro: O que é Racismo de Joel Rufino dos Santos - Coleção Primeiros Passos, Brasiliense - Download -
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Alguns tentam provar que as diferenças sociais são determinadas por fatores biológicos. Outros explicam que o racismo surgiu da necessidade de justificar a agressão. Seria verdade? Faria o racismo parte da natureza humana? Neste livro, os primeiros passos para a compreensão deste fenômeno universal, suas modalidades e suas implicações sociais.

9 de abr. de 2010

História do Movimento Negro

Conheça/compre.
Histórias do movimento negro no Brasil
depoimentos ao CPDOC

Texto da contracapa:
Verena Alberti e Amilcar Araujo Pereira
Ed. Pallas 1a edição - RJ - 528 páginas

Este livro é resultado de uma pesquisa desenvolvida entre 2003 e 2007 no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fundação Getulio Vargas, com o objetivo de formar um banco de entrevistas com lideranças do movimento negro no Brasil a partir das décadas de 1970 e 1980 em todas as regiões do país. Histórias como a da criação do Grupo Palmares, no Rio Grande do Sul, em 1971, a da fundação do primeiro bloco afro na Bahia, o Ilê Aiyê, em 1974, assim como a da formação do Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará, em 1980, por exemplo, estão, pela primeira vez, lado a lado com histórias de organizações criadas no Rio de Janeiro e em São Paulo. Não se trata das primeiras organizações de movimento negro da história do país, como mostram as inúmeras notas e a cronologia que completa o livro, mas daquelas que surgiram em pleno regime militar e se proliferaram a partir do lento processo de Abertura política, e numa conjuntura internacional na qual ganhavam força as lutas pela libertação das colônias portuguesas na África e as repercussões dos movimentos pelos direitos civis nos EUA. Além da trajetória do movimento e das experiências de algumas de suas principais lideranças, o livro discute temas com grande visibilidade atual, como a implementação de políticas de ação afirmativa, incluindo as cotas nas universidades, o reconhecimento da propriedade de terras de “quilombos” e a participação de militantes em diferentes instâncias do poder público.


1ª publicação da postagem: 13/02/2008 


Download aquiTrabalho apresentado ao grupo temático "Identidade negra e reconhecimento" no III Congresso Brasileiro de Pesquisadores Negros"Pesquisa Social e políticas de Ações Afirmativas", realizado na Universidade Federal do Maranhão. São Luis (MA), 6 a 10 de set. 2004.


Última atualização: 08/04/2010 - Republicado